GRUPOFRENTE
Mário Pedrosa

A idéia de "grupo" é, em nossos dias, uma idéia suspeita. Sobretudo em um país como o nosso, de individualistas amorfos quando não de energúmenos sempre prontos a deixar-se mobilizar pelo primeiro camelo que aparece. Principalmente quando o camelo usa vestes berrantes, ou vende as virtudes miríficas da propaganda política. Pois foi dentro desse nosso meio, cético e superficial ou de crendices ainda superficiais, que apareceu, e hoje se mantém, o grupo Frente.


Weissmann e Leontina
Inauguração da exposição

Os seus membros são todos jovens. E as adesões com que tem crescido têm sido invariavelmente de personalidades ainda jovens. Isso quer dizer que a grupo está aberto... para o futuro, para as gerações em formação. Mais promissor ainda é o fato de o grupo não ser uma panelinha fechada, nem muito menos uma academia onde se ensinam e se aprendem regrinhas e receitas para fazer Abstracionismo, Concretismo, Expressionismo, Futurismo, Cubismo, Realismos e Neo-realismos e outros ismos. Estão admirados dessa afirmação? Pois olhem, é só olhar: aí está Elisa ao lado de Serpa; Vai junto a Lygia Clark; aí estão Franz Weissmann e Lygia Pape; Vincent, romântico, encostado a João José, concretista; e Décio Vieira e Aluísio Carvão, irmãos mas tão diferentes! E não falemos nesse terrível Abraham Palatnik, inventor, construtor, novelista, artista de inteligência que não poupa as meias medidas nem as concessões aos entre lá e cá.

Não se riam, porém, os céticos e amorfos. Não se juntam esses artistas em grupo por mundanismo, pura camaradagem ou por acaso. A virtude maior deles continua a ser a que sempre foi: horror ao ecletismo. São todos eles homens e mulheres de fé, convencidos da missão revolucionária, da missão regeneradora da arte. Uma coisa os une, e com a qual não transigem,dispostos a defendê-la contra tudo e contra todos, colocando-a acima de tudo e de todos — a liberdade de criação. Em defesa desse postulado moral não dão, não pedem quartel.

Essa atitude não quer dizer que sejam pelo ridículo princípio parnasiano da chamada "arte pela arte". A arte para eles não é atividade de parasitas nem está a serviço de ociosos ricos, ou de causas políticas ou do Estado paternalista. Atividade autônoma e vital, ela visa a uma altíssima missão social, qual a de dar estilo à época e transformar os homens, educando-os a exercer os sentidos com plenitude e a modelar as próprias emoções.

Os artistas do grupo Frente procuram a disciplina ética e a disciplina criadora: do contrário não poderiam experimentar livremente, como fazem.(...)
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O 'Flautista'
último figurativo de Weissmann

'Dois cubos virtuais'

Diferentemente da maioria dos outros do grupo, com Franz Weissmann a experiência não aparece quase nunca livremente, como um jogo. Ou melhor, ela só aparece, em profundidade, com a obra, fruto de madura reflexão. As experiências nele se sucedem como as horas do dia; a realização, entretanto, é uma só entre as muitas, as muitas horas do dia e da noite que consome experimentando, que consome em vivências. Isso não quer dizer que, em meio aos seus esforços de apreender o espaço, articulando-o com a linha ou o plano em triedros, tetraedros, poliedros, uma experiência de momento não se cristalize, como uma espécie de intermezzo barroco, num tocador de flauta, por exemplo. Weissmann adora o arame, o fio de aço, se entretém prazerosamente com o alumínio, em vergão ou em folha, com o metal amarelo e outros materiais que ele vai buscar em plena utilização prática, nas oficinas mecânicas.
(...)

Está feita a apresentação do grupo Frente, que agora, graças à boa iniciativa da direção do Museu de Arte Moderna, atinge o grande público, através da mostra que ora se inaugura. (...)
 

Rio, junho de 1955.
Segunda Mostra Coletiva, Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.
©Mario Pedrosa