FRANZ WEISSMANN
SÉRIE 1974-1975

O convívio de longos anos com Franz Weissmann me permite pressentir quando ele abre um novo capítulo, quando ele está de mudança. Mudar de fase é próprio a qualquer artista pouco comprometido com um gênero de estilo fundamental, mas se torna extremamente difícil para aqueles que, como Franz Weissmann, se segregam num limitado campo de renovação, confinando-se na aridez do construtivismo.

Não é viável exigir-se novidade na depuração, do mesmo modo que não se procura o supérfluo no essencial. A mais remota peça de sua criação (da qual resta somente uma velha fotografia) é a de uma figura feminina, modelada em termos de cubismo sintético, no gesto de desnudamento. Esta peça, embora perdida, é a chave que explica todo o percurso, seu constante despojar, a busca de uma nudez da forma, do essencial virtualizado entre um plano e um espaço.

Aquela velha e desbotada fotografia sombreia a mais recente obra do escultor. Dá-lhe coerência em tudo que fez, e que faz.

Vigia, na memória, cada forma conquistada e jamais lhe permite sair do silêncio e do espaço.

Franz Weissmann dispõe, hoje, de singular mérito entre os grandes escultores de nosso tempo. É observado por críticos e artistas de vários outros países, é ponto de referência indispensável quando se alinham os exegetas do geometricismo e é a fonte reconhecível que nutre e fertiliza um crescente número de seguidores.

Seus achados, formulações e soluções são quase imediatamente assumidos por outros, e de tal modo a semente é boa que todos se situam entre os renovadores do vocabulário plástico.

Tão rápida e ampla se faz a influência deste artista que a ele cabe reformular e inovar constantemente sua própria estilística.

Pode ser que a imitação seja até uma virtude pela generalidade que implica, comunicando e distribuindo a descoberta.

Contudo traz ao imitado o compromisso de se revisar sempre, obrigando-o a admitir a invenção como o cotidiano.

Sim, porque toda obra imitada é, para o criador, uma obra cansada, isto é, superada.

Cada fase de Franz Weissmann é uma generalização quase imediata, desde o tempo do concretismo. Sabendo-se que qualquer um de seus trabalhos resulta de prolongada meditação e experiência, que em momento algum vem de um impulso lírico, pode-se imaginar que a matéria essencial de sua obra é o próprio tempo.

Afirmo, sem titubeio, que ele é um dos poucos criadores de nossa época ligados à problemática da dimensão tempo-espaço, como atributo fundamental.

Em 1972 suas construções monumentais expostas nos jardins da Bienal de Veneza foram, sem favor, o ponto mais alto da interrogação oficial sobre escultura integrada à arquitetura e à paisagem.   Weissmann, sabiamente, preferiu plantar suas obras ao redor do Pavilhão Brasileiro nos jardins da Bienal, entre árvores, nos caminhos, ao alcance dos transeuntes.

Deu ao seu observador, ao invés do confronto de épocas, o confronto dos seres, entre sua construção linear e virtual e as tílias verdejantes. Para aquela fase, de Veneza de 1972, talvez fosse razoável denominá-la de temática do cubo, considerando o módulo como ponto de partida para o infinito das proposições.

Desde então Franz Weissmann ficou ensaiando e revendo precursores até que em 1974, instigado por esta exposição da Arte-Global de São Paulo, descobriu-se em sua mais recente fase. Foi a circunstância de sala continente delimitada, oferecendo mais parede que espaço livre, que o fez meditar e decidir por novas soluções formais.  Considerou o plano parietal vertical como integrante do objeto, e para ele fez os projetos de caixas.  Dessa vez a cor é usada como matéria da qual emerge a forma sempre resultante da ruptura do corpo. Desse processo, entre matéria, corpo e ruptura, surgem os espaços virtuais.

O espaço deixou de definir o corpo. Agora é criado e integrado, indissolúvel. Há mais interação entre cor, forma e planos que participação dos elementos.

A cor assume a mesma importância como nas construções de Robert Adams, de Hans Uhlmann, de Anthony Caro, de Isaac Witkin, para lembrar alguns dos construtivistas contemporâneos.

Com esta exposição Franz Weissmann abre um novo capítulo em sua extraordinária e silenciosa carreira, ao propor notáveis construções para se integrarem ao plano parietal, como problema específico da arquitetura.

Após a demonstração internacional da integração à paisagem, em Veneza, propõe sob o rigor de uma tese a obra de arte que já não se acomoda entre os gêneros convencionados — da escultura, ou da pintura — mas que procura dialogar com uma outra globalidade — a da arquitetura.

Assim é a série 1974-1975, produzida em surdina e, entretanto, relevante. Franz Weissmann traz a todos nós, que tanto nos preocupamos com o destino das artes brasileiras, o conforto de verificar sua criatividade e produção ao nível dos melhores exemplos e autores, de qualquer parte.
 

©Clarival do Prado Valladares
Rio de Janeiro, fevereiro 1975.
Catálogo Exposição Galeria Arte Global – Maio 1975 SP